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/E eles foram para o mar

Foi em 1977, há exatamente 30 anos. Ao lado da Petrobras, que vivia então uma incessante busca por depósitos de petróleo, professores e alunos da COPPE mergulharam no mar. Ali ajudaram a erguer a tecnologia que hoje dá ao Brasil a liderança mundial da exploração e produção de petróleo em águas profundas.

Quando a Petrobras e a COPPE assinaram, em 1977, o primeiro grande convênio de cooperação celebrado entre a empresa e uma universidade, deram início a uma parceria duradoura, que ajudou a mudar a face da indústria brasileira de petróleo. A cooperação gerou até agora mais de 2 mil projetos de pesquisa, formou centenas de mestres e doutores e resultou na criação de cursos de pós–graduação lato sensu e de especialização.

Para a COPPE, a cooperação com a empresa propiciou, de um lado, recursos materiais, visíveis nos sofisticados laboratórios que hoje se espalham pelo campus. Resultou também, e principalmente, na abertura de um vasto horizonte de conhecimentos, que alargaram as fronteiras tradicionais da engenharia civil, onde a cooperação havia começado, levando-as para áreas tão variadas como a inteligência artificial, o sensoriamento remoto e a biologia.

Hoje, esse conjunto de conhecimentos acumulados nas últimas três décadas está sendo aplicado por profissionais da COPPE para produzir formas de energia, ambientalmente mais limpas, preparando o Brasil para a era da sustentabilidade. No mar e fora dele.

As primeiras braçadas na água

No começo dos anos 70, a economia brasileira crescia aceleradamente. Era o chamado “milagre econômico” – movido basicamente a petróleo importado. Nessa ocasião, a Petrobras produzia algum óleo em terra e extraía outro tanto do mar de Sergipe, onde em 1968 descobrira o primeiro campo marítimo brasileiro. Eram águas rasas, não mais que 30 ou 40 metros de profundidade.

Embora executados por estaleiros nacionais, os projetos estruturais das primeiras plataformas de produção usadas no Nordeste foram feitos no exterior. Baseavam-se em especificações técnicas do American Petroleum Institute desenvolvidas para o Golfo do México.

O primeiro choque do petróleo, imposto pelos países árabes em 1973, foi um baque. A pesada dependência brasileira das importações de óleo drenava dólares, desequilibrava as contas nacionais e ameaçava interromper o crescimento econômico. Pressionada, a Petrobras intensificou os esforços para achar e produzir petróleo no mar, fazendo furos exploratórios no litoral fluminense e capixaba. Em novembro de 1974, veio a primeira boa notícia: a empresa descobrira o primeiro campo de petróleo da bacia de Campos, o de Garoupa. Depois, em rápida sucessão, foram descobertos Pargo, Namorado e Badejo, em 1975; Enchova, em 1976; Bonito e Pampo, em 1977. Havia, porém, um grande problema: os poços prometiam muito petróleo, mas cada nova descoberta estava mais distante do litoral e em águas bem mais profundas (acima de 100 metros) que os pequenos campos do Nordeste. E também que os do Mar do Norte e do Golfo do México, onde então se concentrava a experiência internacional em engenharia offshore.

Por essa ocasião, o Programa de Engenharia Civil da COPPE começava a estudar o uso de métodos computacionais para fazer análise estrutural. Para projetar uma estrutura, é preciso antes analisar os esforços a que ela será submetida. Estruturas como pontes e edifícios têm um comportamento relativamente fácil de analisar – além de serem estáticas, em geral a única ação dinâmica a que são submetidas é a do vento. Já as estruturas no mar, além de se moverem, interagem com uma variedade de agentes dinâmicos, como ondas e correntes marinhas, além do próprio vento. Exigem, pois, uma análise estrutural mais complexa. Daí a utilidade dos métodos computacionais.


Foi de Agustín Juan Ferrante a idéia de procurar a Petrobras e oferecer os serviços da Coppe. Professor do Programa de Engenharia Civil - para onde fora trazido por Fernando Lobo Carneiro, então coordenador do Programa - Ferrante estava introduzindo na América Latina um sistema computacional criado nos Estados Unidos pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), onde fizera o doutorado. O sistema, chamado Strudl (Structural Design Language), se prestava ao desenvolvimento de sistemas computacionais para a análise de estruturas complexas, que exigiam uma boa análise dinâmica.

Ferrante passou quase um ano – de meados de 1976 a meados de 1977 – buscando estabelecer uma cooperação da Petrobras com a COPPE. As conversas não evoluíam. Até que houve uma reestruturação na empresa e foi criada uma Divisão de Engenharia com a missão de dar mais ênfase a projetos offshore. Para chefiá-la foi nomeado um antigo e experiente engenheiro da Petrobras, Sergio Mueller. Convencido de que a empresa já havia acumulado certa experiência operacional e de construção, e que agora era hora de desenvolver pessoal e tecnologia de engenharia, Mueller defendeu a proposta da COPPE junto a seus superiores. Em pouco tempo, estava formatado o hoje histórico convênio de cooperação. Assinado no segundo semestre de 1977 e batizado de “Recursos Computacionais de Engenharia Offshore”, o documento previa o desenvolvimento dos programas computacionais que permitiriam à Petrobras projetar suas próprias plataformas e a formação de recursos humanos.

Assim, a empresa começou a enviar seus engenheiros à COPPE para a realização de cursos de mestrado, doutorado e especialização. Ao mesmo tempo, Ferrante, à frente de um pequeno grupo que incluía seus alunos de doutorado Nelson Favilla Ebecken e Edison Castro Prates de Lima, mergulhou no desenvolvimento dos sistemas computacionais desejados pela Petrobras. Eram os sistemas que, mais tarde, seriam conhecidos como Adep (sigla para Análise e Dimensionamento de Estruturas e Plataformas) e Inpla (sigla para Instalação de Plataformas). Sistemas proprietários da Petrobras, ambos seriam largamente utilizados pela empresa para projetar e instalar dezenas de plataformas.

COPPE aponta falhas no projeto da plataforma Garoupa

Um grande impulso para o convênio entre a COPPE e a Petrobras veio em 1979, com um acidente no campo de Garoupa. A torre de processamento de uma plataforma de produção projetada pela empresa norte-americana Chicago Bridge & Iron rompeu-se e afundou no mar. Os prejuízos da Petrobras foram agravados pela interrupção da produção, justo no ano em que os países árabes promoviam um segundo choque do petróleo, com nova escalada de preços para o produto.

Nas investigações que se seguiram para apurar responsabilidades, a pequena e jovem equipe liderada por Ferrante no Programa de Engenharia Civil – Nelson Ebecken, Edison Prates e Gilberto Ellwanger, com a ajuda de Sergio Sphaier, do Programa de Engenharia Naval e Oceânica - demonstrou que houve falha de projeto. Acostumados com as grandes calmarias e fortes tempestades do Golfo do México, os projetistas norte-americanos não haviam levado em conta as diferenças do mar de Campos – desprovido de grandes calmarias e tempestades, mas permanentemente agitado ao longo de todo o ano. O projeto não considerava a ação continuada de pequenas ondas, agravada pelo fato de que o conjunto do qual fazia parte a torre acidentada estava conectado a um navio, o que aumentava os esforços sobre ela e acelerava a fadiga do material. Além de explicarem por que a torre de processamento se rompera, os profissionais da COPPE ainda alertaram que o mesmo iria acontecer com a outra torre, a de carregamento.

Graças ao laudo da COPPE, a Petrobras foi indenizada pela Chicago Bridge & Iron. O episódio chamou a atenção da empresa para a eficiência da instituição e, por tabela, da universidade brasileira de um modo geral, com a qual passou a interagir cada vez mais.
 

 

  • Publicado em - 10/12/2007