/Maglev-Cobra: um projeto inovador em busca de parcerias
O projeto do Maglev-Cobra, o trem de levitação magnética da Coppe/UFRJ, foi objeto de debate, dia 29 de novembro, na UFRJ. Promovido pela Coppe, o Workshop Maglev-Cobra: Investimento, Interdisciplinaridade, Pesquisa & Desenvolvimento contou com a participação de 16 profissionais de diversas áreas, cujas apresentações revelaram o alto grau de interdisciplinaridade do projeto de veículo por supercondutividade mais avançado do mundo. No evento também foram debatidos os desafios a serem superados para que esta tecnologia esteja, em breve, disponível para ser reproduzida em escala industrial, contribuindo para melhorar a mobilidade nas grandes cidades com menor impacto ambiental. O workshop reuniu mais de 90 pessoas, entre pesquisadores, alunos, representantes de empresas e do setor público.
Tendo realizado mais de 10 mil viagens desde que a linha entre os prédios do Centro de Tecnologia (CT 1 e CT 2) foi inaugurada em 2016, o Maglev-Cobra precisa passar por um oneroso processo de certificação internacional para que seja implementado em trajetos urbanos mais longos, em operação comercial, concretizando o objetivo proposto: trazer ao país uma alternativa eficiente de transporte de massa, sustentável, silencioso, com custo de implementação inferior aos trens de superfície, e com tecnologia nacional, gerando empregos qualificados e promovendo a diversificação do parque industrial brasileiro.
O Maglev-Cobra foi desenvolvido por pesquisadores do Laboratório de Aplicações de Supercondutividade (Lasup) da Coppe, sob coordenação do professor Richard Stephen. Para vencer os desafios tecnológicos impostos para a implementação de um projeto de tamanha complexidade, o professor Richard contou com a colaboração de diversos pesquisadores, alunos e técnicos da UFRJ, e o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Também contou com a colaboração, por meio de contratação de serviços, de empresas nativas da universidade (Seahorse, Holos Brasil, Recriar Tecnologias), e grandes empresas nacionais e internacionais.
À frente da concorrência
O workshop contou com uma apresentação minuciosa do projeto feita pelo engenheiro mecânico Felipe Costa, do Lasup, desde a sua origem, passando pelas vantagens tecnológicas do Maglev, como o baixo consumo energético, a baixa emissão de ruídos, nenhuma emissão de poluentes; uso de vias leves; baixo custo de construção civil; curvas com raios pequenos; trilhos com apenas 350 kg por metro; não há desgaste do material levitante.
O Maglev-Cobra está à frente dos seus concorrentes alemães e chineses. "A China possui um protótipo que transporta uma única pessoa, em Chengdu, em uma pista fechada, em laboratório, de 45 metros. Em Dresden, o Supertrans transporta dois passageiros também em uma pista laboratorial, de 80 metros", explicou Felipe.
Segundo Felipe, além de oferecer uma alternativa segura, econômica e ambientalmente responsável, o projeto ainda traz desdobramentos positivos que devem atrair o interesse empresarial, como a demanda por ímãs de terras raras, supercondutores e conversores de potências (possível interesse para a empresa WEG), vagões leves (possível interesse da Embraer, sua concorrente Bombardier produz vagões no Canadá).
Em operação desde 2014, o protótipo instalado na Coppe já transportou mais de 10 mil pessoas ao longo do trecho de 200 m de extensão, que liga o CT 1 ao CT 2. Em 2015, o projeto obteve reconhecimento nacional, conquistando o Troféus Frotas e Fretes 2015. O projeto se encontra atualmente no sétimo nível da escala TRL (Technology Readiness Level), que mede quão pronta está uma tecnologia para ser posta a serviço da sociedade. A escala TRL vai de 1 a 9, quando o produto tecnológico já pode ser disponibilizado comercialmente.
Maglev: cinco trajetos traçados para circular no Rio
Durante o evento foram apresentadas diversas contribuições interdisciplinares feitas ao projeto, em aspectos tão variados como sistemas eletrônicos auxiliares; análises de risco e ambiental; combate à oxidação; uso de energia alternativa e otimização. O professor Rômulo Orrico, do Programa de Engenharia de Transportes (PET), colaborou com o professor Richard Stephen realizando um Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA) em conjunto com a empresa Sinergia. O estudo destacou uma vantagem importante do veículo: sua leveza. Para se ter uma ideia, o Maglev, com capacidade máxima de passageiros preenchida, pesa menos que composição equivalente do metrô vazia. O que, dentre outros fatores, indica boa viabilidade econômico-financeira da tecnologia.
O que permite ao Maglev ser tão leve é a sua estrutura, feita em material compósito (fibra de vidro). O veículo foi construído pela Holos Brasil, empresa nativa da UFRJ. "Foi uma surpresa na nossa trajetória sermos convidados para construir um trem. Uma vez, em uma reunião, o diretor do Cenpes, que nos convidou para fazer o casco de uma boia oceanográfica, justificou o convite dizendo 'esses caras fazem barco à vela e quem faz barco à vela faz qualquer coisa'. Há veículos que utilizam material compósito em conjunto com estruturas metálicas. O nosso é 100% em material compósito, mesmo as estruturas primárias. Cada seção do trem saiu da fábrica, ainda sem os equipamentos, pesando menos de 200 quilos. O trem pesa menos de uma tonelada. Talvez esse seja um dos veículos mais leves do mundo", explicou Lourenço Souza, sócio da Holos.
No estudo também foram elaborados cinco trajetos da cidade que Maglev-Cobra poderia atender, com eficiência, a população da cidade do Rio de Janeiro: Rodoviária x Estácio (2,5 km de extensão), com quatro estações, e integração com o metrô. Ilha do Governador x Méier (22 km); Barra da Tijuca (18 km); Rio das Pedras (8 km); e Triagem x Caju (5 km).
De acordo com o professor Rômulo, além da eficiência energética, ambiental e econômica do veículo, a sua implementação traria outras consequências positivas. "O avanço tecnológico significa uma redução na aquisição de tecnologias estrangeiras, e uma redução na remessa de divisas para o exterior. Implementar o Maglev-Cobra significa a diversificação do parque industrial e a geração de empregos qualificados", avaliou Orrico.
Novas tecnologias embarcadas contribuíram para tornar o veículo mais competitivo e eficiente. Doutor em Engenharia Elétrica pela Coppe, atualmente tecnologista da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), Eduardo Mota, explicou ao público o trabalho feito na otimização do uso de trilhos imantados. Os ímãs de terras raras (neodímio e ferro-boro) são os itens mais onerosos na implementação de linhas de Maglev. Para tornar o projeto menos oneroso, foi desenvolvido na Coppe o algoritmo FDIPA (Feasible Direction Interior Point Algorithm), que conseguiu reduzir a quantidade de ímãs necessários à operação do veículo, minimizando assim o custo da quilometragem de trilhos, mas mantendo a força de levitação necessária. "O algoritmo levou a uma economia de 6,7% na quantidade de ímãs utilizados, o que equivale a 130 mil dólares economizados por quilômetro", informou Eduardo.
Estratégia para captação de recursos
O engenheiro Luiz Alfredo Salomão, ex-diretor da Escola de Políticas Públicas e de Governo (EPPG/UFRJ) - descrito pelo professor Richard como um articulador importante na busca por apoio ao projeto Maglev-Cobra - mostrou confiança de que apesar de ser "um momento de muita decepção para todos que acreditávamos na possibilidade de desenvolvimento soberano do país", o projeto encontrará a parceria empresarial necessária para arcar com 10% do investimento, como exigido pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).
"Na minha experiência, bons projetos obtém financiamentos. O que está faltando é a gente fazer política. Para ter dinheiro no orçamento, é preciso construir alianças empresariais e acadêmicas. Política é a forma de buscar a solução pacífica de conflitos. Embora não tenhamos aqui um conflito, e sim um problema de sobrevivência de um projeto importante para o país, que pode trazer uma contribuição concreta e positiva para a sociedade brasileira", avaliou Salomão.
Antes do início do debate com o público que lotou o auditório, foram enumerados pontos-chave necessários para que o veículo obtenha a certificação e possa ser empregado em escala comercial: desenvolver o projeto e uma nova versão do sistema de tração do motor linear; desenvolver sistema de frenagem para o estacionamento, com sistemas de medição e controle especiais; construir módulos do carro-piloto já com instalação veicular adequada; instrumentação dos carros e da composição, precisamos avançar nos sensores para a automação do veículo; projeto de um centro de controle operacional; construir uma linha de 2 a 3 km em local de grande circulação de passageiros para operação semicomercial; e finalmente, promover a certificação do Maglev-Cobra.
O brainstorm proporcionado pelo debate, com pesquisadores, empresários e gestores apresentando variadas sugestões, animou o professor Richard Stephen, coordenador do projeto. "Termino este workshop mais animado do que o comecei. Novas ideias surgiram e há caminhos a seguir para conseguirmos a certificação do veículo e a operacionalização comercial do Maglev", afirmou o professor.
Ao final do workshop, o professor Rubens de Andrade Jr, atual coordenador do Lasup, entregou uma placa em homenagem ao professor Roberto Nicolsky, fundador do laboratório. Confira neste link as apresentações de trabalhos interdisciplinares feitas durante o workshop.
- Publicado em - 05/12/2017