/Perfil
/Roberto Schaeffer: da literatura infanto-juvenil ao relatório do IPCC
As aventuras escritas por Monteiro Lobato, os contos dos irmãos Grimm e outras estórias, lidas na infância, ajudaram a levar o carioca Roberto Schaeffer a lugares diferentes e bem distantes da tranquila Curitiba dos anos 1960, para onde se mudou com a família, aos 5 anos, em 1965. O amor pela leitura, incentivado pelos pais e pelo irmão mais velho, a aplicação nos estudos e o talento levaram Schaeffer, que em setembro de 2012 recebeu o Prêmio Coppe Giulio Massarani – Mérito Acadêmico 2011, a uma brilhante carreira de pesquisador.
Nascido no Rio de Janeiro, em 1960, Roberto Schaeffer morou no Leblon com os pais, Frederico e Regina, o irmão e a irmã mais velhos, até 1965, quando o pai, um pequeno comerciante, mudou-se com a família para Curitiba, para assumir a filial de uma loja de lixas e rebolos. Na capital paranaense, Schaeffer estudou em colégio público e concluiu a graduação em Engenharia Elétrica, em 1982, na Universidade Federal do Paraná (UFPR). “Basicamente, você tinha três cenários: Engenharia, Medicina ou Direito. Naquele momento não se cogitavam outras opções. Então, como eu tinha facilidade para matemática, a opção pela Engenharia era a mais natural”, relembra Schaeffer.
Como não conseguia se ver trabalhando em uma empresa, optou por uma carreira acadêmica. Além disso, a vida em Curitiba, se comparada às lembranças da infância no Leblon, era, para Schaeffer, um tanto monótona. Assim, deixar o Sul para fazer mestrado não foi uma decisão nada difícil. O exemplo de estudar fora, aliás, já tinha sido dado pelo irmão mais velho, que, em 1972, seguiu para São José dos Campos para cursar o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA).
Em 1983, Roberto Schaeffer começou a cursar o mestrado em Engenharia Nuclear e Planejamento Energético na Coppe/UFRJ. Naquela época, o Programa de Planejamento Energético (PPE) ainda não existia. Era uma área nascente dentro da Energia Nuclear. Mas logo ganhou impulso e autonomia decorrentes de intensos fatores externos: os choques mundiais do petróleo, o acidente nuclear de Three Mile Island e, no Brasil, a implantação do Programa Nacional do Álcool, o acordo nuclear entre o Brasil e a Alemanha, e as descobertas de óleo e gás no mar, que deram início à exploração offshore.
Pouco depois de chegar ao Rio de Janeiro, Schaeffer reencontrou Elizabeth, amiga dos tempos de jardim de infância, no Leblon, com quem se casou e teve um filho, Bernardo, hoje com 13 anos. Ao lado de Beth, Roberto partiu para os Estados Unidos, em 1987, onde concluiu o doutorado em Política Energética na Universidade da Pensilvânia. Ela, arquiteta, fez mestrado na Universidade das Artes, também em Filadélfia. Em um tempo relativamente curto, três anos e um mês, Schaeffer conclui o doutorado e, nos dois anos seguintes, foi professor visitante na própria instituição, ministrando cursos de política energética no Centro para Energia e Meio Ambiente, e, também, de economia e política energética brasileira na Wharton School, uma das mais prestigiadas escolas de negócio do mundo, ambos da Universidade da Pensilvânia.
De volta ao Brasil
Ao retornar ao Rio de Janeiro, Schaeffer ingressou na Coppe, em 1993, com uma bolsa de pesquisador-visitante do CNPq, e dois anos mais tarde foi aprovado em concurso público, tornando-se professor do Programa de Planejamento Energético (PPE) da Coppe. Ao longo desses 17 anos de PPE, Schaeffer orientou e coorientou 93 alunos, sendo 72 de mestrado e 21 de doutorado. Publicou 77 artigos em periódicos indexados e 68 trabalhos em anais de eventos científicos, no Brasil e no exterior. É autor, editor e/ou organizador de 12 livros e autor de 44 capítulos de livros. Já foi coordenador do PPE, do qual é, atualmente, vice-coordenador.
A sólida carreira como professor de Planejamento Energético da Coppe acabou por levá-lo a participar – por quatro vezes – da elaboração de relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças do Clima da ONU (IPCC), do qual atualmente é autor-coordenador-líder do capítulo sobre transportes do Quinto Relatório de Avaliação, a ser concluído em 2014. Também presta consultoria externa a vários órgãos internacionais, incluindo o Banco Mundial e a Agência Internacional de Energia Atômica, órgão com sede em Viena.
“Para chegar até aqui, foram muitos anos de trabalho”, recorda Schaeffer, que teve na difícil trajetória de seus pais uma inspiração de vida. Seu pai, Fritz Robert Schaeffer, veio da Alemanha para o Rio de Janeiro em 1936, aos 23 anos, em função da ascensão do nazismo na Europa. Fritz, que passou a assinar Frederico Roberto Schaeffer, reiniciou a vida deixando os sonhos da juventude e todos os bens para trás. A mãe de Roberto, Regina, foi igualmente marcada pelas dificuldades impostas pela perseguição aos judeus. Ela chegou ao Brasil, aos 9 anos, em 1935, acompanhada pelo pai, a madrasta e o irmão mais novo. Trabalhou em casas de família, costurava e entregava manteiga em domicílio. Foi trabalhando em uma loja de tecidos, em Copacabana, que conheceu Frederico, com quem se casou no início dos anos 1950.
Apesar das dificuldades, Frederico e Regina procuraram dar aos três filhos a oportunidade de estudar que eles não tiveram. O estímulo à leitura também era uma preocupação constante. “Para economizarmos na compra de livros, era comum minha mãe me levar de ônibus, às terças e quintas-feiras, à biblioteca pública de Curitiba, onde eu podia pegar emprestado dois livros de cada vez”, recorda Roberto, que entre os 12 e os 13 anos já havia lido todos os títulos da seção infanto-juvenil da biblioteca e, por conta disso, recebeu uma autorização especial para frequentar a seção de adultos.
Ambientalista praticante, Schaeffer mantém coerência entre o que ensina a seus alunos, nas aulas sobre eficiência energética e mudanças climáticas, e o estilo de vida que adota. Costuma manter o ar-condicionado de sua sala sempre desligado e aproveita ao máximo a luminosidade que entra pela janela. Não usa celular, em casa não possui ar-condicionado e evita automóveis de maior cilindrada que consomem mais combustível. Foi durante 19 anos dono de um Voyage 1986, presenteado à esposa pelo pai, em 1993, quando retornaram ao Brasil. Os passeios em família, aos fins de semana, geralmente são feitos a pé ou de bicicleta.
-
Publicado em - 18/09/2012